A principal bandeira de Maria Helena Sartori
Publicado em 2 de outubro de 2017
Com uma vida dedicada à educação em escola pública e à frente de áreas ligadas ao desenvolvimento humano no governo estadual, primeira-dama do Rio Grande do Sul cria projetos para se aproximar daqueles em situação mais vulnerável
Professora aposentada da rede estadual. Formada em Filosofia e pós-graduada em História, também é mãe de dois filhos. Ingressou na política como deputada estadual, em dois mandatos, e assumiria o terceiro, se não fosse convocada pelo marido, José Ivo Sartori, para atuar no Gabinete de Políticas Sociais, em 2015, e, posteriormente, na Secretaria de Desenvolvimento Social, Trabalho, Justiça e Direitos Humanos, no ano passado. Por esse breve histórico, já é possível perceber que Maria Helena Sartori não se detém simplesmente ao título de primeira-dama do Rio Grande do Sul.
Com uma vida dedicada à educação e a projetos sociais, sobretudo ligado às mulheres, Maria Helena levou boa parte da sua bagagem intelectual para aplicar na política. Desde os tempos em que atuava em Caxias do Sul, quando o atual governador do Estado era prefeito da cidade da Serra, ajudou a implantar diversos programas, com enfoque no combate ao câncer de mama e na prevenção à gravidez precoce. À frente de uma pasta cujo assunto é tratado com tanto cuidado – o alvo são as pessoas em situação de vulnerabilidade, seja crianças e adolescentes, seja da população carcerária de homens e mulheres – a busca pela humanização e da ressocialização é uma das bandeiras da secretária, com o simples objetivo de melhorar a vida dessas pessoas e trazer-lhes esperança de um futuro melhor. Além disso, há o empenho de trazer mais mulheres para a política, a fim de promover a igualdade e diminuir o machismo que perdura na profissão.
Atualmente, Maria Helena carrega a bandeira de programas voltados para a formação desde o princípio da vida, como o Primeira Infância Melhor (PIM) e a Comissão Interna de Prevenção a Acidentes e Violência Escolar (CIPAVE). O PIM trata da criança desde o nascimento, junto com os pais, a fim de dar apoio e informação acerca dos cuidados que a família inteira precisa ter nessa nova etapa da vida, com uma pequena vida surgindo para o mundo. Já a CIPAVE age quando a criança ou adolescente já está na escola, com o objetivo de localizar possíveis focos que desvirtuem o caminho do jovem em relação à educação, como a criminalidade, a violência, prevenindo e debatendo o assunto com toda a comunidade escolar. Em maio deste ano, Maria Helena Sartori e sua equipe montaram um catálogo com ações integradas entre os Estados e municípios do RS e apresentou-o às primeiras-damas, num encontro realizado em Porto Alegre. Tudo com o intuito de fomentar e espalhar essas ações por todo o território e tentar, aos poucos, melhorar a situação daqueles que são menos favorecidos.
A Maria Helena que entrou na política e a que encontramos hoje, no que elas se diferenciam?
Eu comecei a fazer política desde os tempos da faculdade, quando conheci o (José Ivo) Sartori. Ele era o presidente do Diretório Central da universidade. Depois, ele se elegeu vereador (em 1977) e nós nos casamos. Nosso primeiro filho veio logo após ele ter sido eleito deputado estadual (1983). Então, estive sempre ligada à política. Minha primeira candidatura foi em 2002, graças a uma divisão no PMDB, quando eu assumi a área da mulher no partido e fui para a eleição. Hoje, posso dizer que estou mais tolerante, mais experiente, mais compreensiva em algumas situações, mas meu jeito não mudou muito. Na época em que estava à frente do CPERS, as mulheres iam nas reuniões para ver se eu estava calma, pois isso era sinal de que as coisas estavam sob controle. Não consigo trabalhar com tensão no ambiente, criar um circo para resolver qualquer coisa, vou colocando panos quentes para não perder o controle.
Quais os ensinamentos que você, com formação em filosofia, ex-professora e até presidente de CPERS trouxe consigo para a política?
A preocupação com a educação, a ética, algo que é muito ensinado na filosofia, a praticidade, a racionalidade nas ações, eu gosto muito de perguntar sobre as coisas e saber por que tal situação acontece dessa forma. Por sinal, fui para a faculdade de filosofia a convite de um professor, justamente pelo fato de querer questionar sempre.
Você foi professora da rede estadual e em sua função pública sempre esteve envolvida com desenvolvimento social também. A educação e a formação da criança deveriam, na teoria, acontecer juntas, mas muitas vezes o caminho não é assim trilhado. Como auxiliar neste processo?
Nós temos hoje o programa Primeira Infância Melhor, em parceria com os munícipios. Através dele cuidamos de crianças em situação de vulnerabilidade entre zero e três anos. Há uma frase que retrata bem o significado desse período: “o que você fizer pelo seu filho no início da vida, será para o restante dela”. Toda mãe deveria ter contato com o programa, há mães que não sabem o que estão fazendo. Uma delas, por exemplo, não sabia da necessidade de brincar com o filho. Há também uma outra iniciativa cujo objetivo é reunir pais, alunos, professores e diretores para discutir melhorias no ambiente escolar, e há depoimentos de alunos que aprenderam a respeitar o próximo, pois entenderam o reflexo disso, em respeito para ele também. Em outra escola, foi criada uma campanha para a paz no bairro onde estão. Fico gratificada de estar na política e ver ações como essas acontecerem dentro das escolas.
Há preconceito e é possível dizer que a participação da mulher ainda é desigual na política brasileira?
Na política, na minha opinião, há maior desigualdade. Se olharmos para outras profissões, a mulher está mais presente – ainda que em menor porcentagem – mas está lá. Procuramos focar nos municípios, com o intuito de permanecerem nas suas cidades e participarem ativamente. Em cargos estaduais e federais, a presença é menor. Todavia, ainda vemos um desconforto de um homem ser liderado por uma mulher. Eu fui convidada pelo ex-governador Germano Rigotto para ser líder do governo na Assembleia no mandato dele. Até então, nenhuma mulher havia chegado a esse posto e alguns colegas de bancada, de maneira indireta, comentaram “o que deu no governador para colocar uma mulher como líder?”. A sociedade tem conceitos diferentes para homem e mulher. Por exemplo, se um deputado faz um discurso inflamado na tribuna, ele é classificado como excelente orador. Se for uma deputada, acham que está na TPM, é histérica. Por quê? Queremos espaços iguais e lutamos por isso, mas a sociedade continua nos vendo de forma diferente.
Ainda no tema das mulheres, o Rio Grande do Sul tem uma média de quase quatro estupros por dia. O que você, na condição de secretária, pode fazer para ajudar a reduzir esse número?
Nós temos que trabalhar essa questão com os homens. Eles precisam se conscientizar e serem tratados acima de tudo. Há uma cultura por trás desses números. O sentimento de posse ainda existe e os feminicídios – quando uma mulher sai do relacionamento, mas o homem, por não aceitar, acaba a matando – são preocupantes. Por mais que haja o afastamento da companheira daquela relação, se ele não for tratado, fará tudo novamente com outra mulher. Remeto esse pensamento novamente ao programa Primeira Infância Melhor. Se aquela criança for tratada com carinho, com amor, ela será diferente. Já evoluímos bastante no tratamento entre meninas e meninos, alguns já estão mais cientes das divisões de tarefas domésticas, por exemplo, mas temos que estar atentos ao comportamento dos mais jovens agora para mudar esse paradigma no futuro.
Estamos em um momento que a classe política está em xeque, fruto de acusações quase diárias de corrupção em todos os níveis. Na sua opinião, o que significa este momento com olhos ao horizonte?
Eu penso que a partir desse momento as coisas vão mudar. Os próprios políticos precisam entender isso. Ou o Congresso muda ou ele será mudado. A organização da sociedade depende disso. Há problemas em todos os setores, mas a classe política precisa começar a fazer a diferença agora. Passaremos por um momento de “limpeza” e mudança de conceitos, para que quem esteja na política faça acontecer da maneira correta. Isso passa pela reforma política, pela reforma da máquina pública, discutir o que cabe ao governo fazer. Essa é a hora para discutirmos esses pontos.
O que a família Sartori faz nos seus momentos de folga?
Nossos filhos continuam em Caxias, então, quando estamos todos reunimos, almoçamos e jantamos juntos. Criamos uma combinação desde o tempo em que o Sartori era deputado estadual e eu ficava em Caxias do Sul: irmos apenas nós quatro – eu, ele e os filhos – sem amigos. E procuramos fazer isso ainda hoje, “puxar o saco” um pouco dos filhos (risos). Quando é possível, também viajamos, nem que seja um final de semana prolongado.
Você vê interesse dos filhos em seguir na vida pública? O que conversam com eles sobre o assunto?
Acho que não. Eles sofrem bastante com isso. Quando eu entrei na política, na primeira eleição meu filho disse: “já chega o pai como político!”. Foi bem categórico. Na segunda, ele me ajudou e se entusiasmou, mas não podia se candidatar, e deixou de lado. E também já estão em outras áreas, então acho pouco provável seguirem os pais na profissão.
PROGRAMA PRIMEIRA INFÂNCIA MELHOR (PIM)
-Criado em 2003, desenvolve-se através de visitas domiciliares e comunitárias realizadas semanalmente a famílias em situação de risco e vulnerabilidade social, visando o fortalecimento de suas competências para educar e cuidar de suas crianças;
– É composto por seis secretarias estaduais e executado pelas prefeituras municipais;
-Usou como referência a metodologia do projeto cubano Educa a tu Hijo (Eduque seu Filho), do Centro de Referência Latino-americana para Educação Pré-Escolar;
-Conforme levantamento feito pela Secretaria Estadual de Saúde, por ano são atendidas, em media, 55 mil famílias em todo o Rio Grande do Sul em cerca de 240 municípios;
– Neste ano, ainda segundo o levantamento, mais de 57 mil crianças já receberam os visitadores habilitados. São cerca de 2600 profissionais que circulam pelas cidades atrás de casos que se encaixem no programa.
– Os primeiros resultados do programa apontaram presença maior dos pais na educação dos filhos, redução na vulnerabilidade de aprendizagem das crianças e maior impacto positivo em quem participou do programa mais de dois anos
FONTE: http://www.pim.saude.rs.gov.br
Comissão Interna de Prevenção a Acidentes e Violência Escolar (CIPAVE)
– A Cipave tem com o objetivo principal trazer para o debate todos os envolvidos no processo educativo dos alunos das escolas municipais. A proposta inicial era formar uma comissão interna na escola, que debatesse as questões que preocupavam a comunidade escolar, como a violência e os acidentes envolvendo os estudantes;
– Foi criada em 26 de junho de 2012, por Maria Helena Sartori. A data é alusiva ao Dia Estadual da Prevenção à Violência Escolar;
– As comissões já existem em 2.325 escolas públicas gaúchas (90% do total);
– Há o diálogo aberto sobre violência, drogas, bullying e preconceito, entre outros temas. Alunos, professores, pais, funcionários, policiais, promotores e defensores públicos participam dos debates.