A dama dos charutos

Considerada uma das melhores sommeliers de charutos do mundo, a espanhola Manuela Romeralo fixou raízes em um terreno que era predominantemente masculino. Há mais de dez anos vem desvendando a complexidade de aromas e sabores percebidos em cada peça. Nesta entrevista, ela fala, da Espanha, onde reside,  sobre o prazer de degustar um bom charuto, harmonizações e sua wishlist entre as marcas brasileiras

Manuela Romeralo coleciona títulos respeitáveis. Em 2005, às cegas, foi capaz de reconhecer 50 tipos diferentes de água mineral, sendo eleita a melhor sommelier desta bebida na Espanha. No ano seguinte, venceu o Concurso Internacional de Habanosommelier, que acontece anualmente em Havana. Com esse resultado, fez história: foi a primeira mulher a entrar para o rol dos melhores sommeliers de charutos do mundo. Na sequência, mais algumas conquistas como melhor sommelier –  da Espanha (2009) e da Europa (2011).

Atualmente, Manuela está à frente de três restaurantes em Valência – El Poblet, Vuelve Carolina e Mercatbar – e viaja o mundo para ministrar cursos e palestras sobre charutos e suas harmonizações, em especial com vinhos e destilados.

Atualmente, Manuela está à frente de três restaurantes em Valência – El Poblet, Vuelve Carolina e Mercatbar – e viaja o mundo para ministrar cursos e palestras sobre charutos e suas harmonizações, em especial com vinhos e destilados. Mas ela também sugere que se prove com café e chocolate amargo (70% cacau). Embora existam algumas regras, já que nenhum produto deve se sobrepor ao outro, a sommelier garante que o importante é fazer suas escolhas pessoais e ser feliz, desfrutando de todo o prazer proporcionado por este ritual.

A especialista já esteve algumas vezes no Brasil, contando sobre suas técnicas e predileções. Primeiro ela acende o charuto, para só depois retirar a ponta (o lado em que você põe a boca). Explica que, dessa forma, não haverá uma perda inicial de aromas, mantendo toda a complexidade da peça. Na hora de escolher o acessório para o corte, prefere a tesoura à guilhotina, por que consegue controlar melhor o corte, que deve ser bem reto. Para acender, indica folhas ou lâminas de cedro. Demora-se neste momento, deixando a brasa uniforme para que o “tiro” saia perfeito.

Na entrevista a seguir, entre outras questões, a espanhola fala sobre as características que devem ser observadas nos charutos. E neste caso vale lembrar que o estado de conservação depende das condições de armazenamento do produto. Muitos apreciadores têm o costume de comprar charutos quando viajam ao exterior. Mas eles também podem ser encontrados em casas especializadas em Porto Alegre. Uma delas é a Paromas, referência no segmento na capital gaúcha, que está há quase 20 anos no mercado e é reconhecida pela variedade de marcas e acessórios relacionados ao mundo do tabaco.

Revista Gente que Faz – O primeiro charuto a gente nunca esquece? Como foi a experiência?
Manuela Romeralo –
Foi assim mesmo, inesquecível. Lembro que estava já há alguns meses lendo sobre tabaco, estudando seu cultivo, sua elaboração, e chegou o momento em que senti necessidade de experimentar tudo aquilo que eu havia lido. Fui ao local onde o restaurante em que trabalhava comprava seus cigarros e falei com Luis Soriano, que me deu um Habano para fumar pela primeira vez. Foi um Hoyo de Monterrey Epicure Nº 1, que fumei à noite, ao chegar em casa, depois do trabalho. Lembro-me da surpresa que senti ao encontrar tanta complexidade de aromas e sabores. Fiquei empolgada com aquela experiência.


O que define um bom charuto? Que características um iniciante deve observar na hora da compra?
Principalmente o estado de conservação, ou seja, a umidade e a temperatura. Se o tabaco esteve guardado em um ambiente com umidade muito alta, terá este sabor e uma má combustão. Se, ao contrário, o cigarro apresentar-se seco, com umidade deficiente, arderá rapidamente e terá um sabor picante. A apresentação é importante também: se a capa é firme, se não tem veias muito marcadas. Cada fumador decide que cor de capa lhe é mais atrativa, se mais clara ou mais escura. Mas isso é uma questão estética, pois sabe-se que a capa não indica a força do charuto. Também é necessário escolher o tamanho e força em função de ser ou não fumador experiente, e do tempo disponível para fumar. Cada charuto tem um tempo de fumada que deve-se conhecer para evitar ter que abandoná-lo por falta de tempo. Em casos assim, não se poderá ter uma opinião correta sobre o tabaco, uma vez que ele irá mudar no início ao fim, e a experiência acabará por ser incompleta.

Os charutos mais caros são, de fato, os melhores?
O melhor charuto é o que cumpre nossas expectativas. Em muitos casos não necessariamente gostamos dos mais caros, mas em outros, sim. Como o Cohiba, que é a marca de Habanos mais cara, mas com certeza elaborada com a melhor matéria prima, com um tratamento especial que não é aplicado no resto das marcas cubanas.

Homens e mulheres costumam ter gostos distintos na degustação de charutos?

Não quando têm o mesmo nível de experiência com o tabaco. Não há diferença na hora de entendê-lo, de fumá-lo ou desfrutá-lo. Prazer é prazer, independente de sexo. Mas é possível que os iniciantes sintam diferença em razão da força, do tamanho e da grossura. Mas ao chegar ao ponto de ser um fumante já experimentado, tanto homem quanto mulher desfrutam da mesma maneira as sensações que proporcionam um bom charuto.

Qual foi sua melhor harmonização?
A que me permitiu passar à final do Campeonato Mundial em Cuba: Montecristo Nº 2 & Single Malt Bowmore Darkest. E também outra que consegui fazendo um trabalho para Remy Martin: Cohiba Espléndido & Cognac Louis XIII.
Como podemos deixar o paladar mais apurado?
Creio que é uma questão de treino, de provar muito para criar uma boa memória olfativa e gustativa, com um grande número de registros que nos permitam identificar e reconhecer os estímulos quando os tivermos à frente. Algo que pode ajudar é usar com medida temperos e sal, por exemplo, para aumentar o nosso limiar de percepções.

Atualmente, quais são as melhores marcas brasileiras de charutos?
Gosto muito de Dannemann (Artist Line), Alonso Menéndez, Dona Flor, Monte Pascoal, entre outros. São marcas que, apesar de não poder fumar na Espanha, tenho a grata lembrança de quando visitei o país.

Para quem quer entender mais do assunto, que livros indica?
Os livros que eu teria na cabeceira seriam: Habano, el Rey; Cultivando una tradición de perfección e Guía Epicur del Habano.


Entre amigos

A degustação do charuto tanto pode proporcionar um momento mais solitário e introspectivo, como uma conversa descontraída entre amigos, de acordo com a personalidade e estado de espírito de cada um. O empresário Darci Giovanella aprecia um cubano depois das partidas de golfe, com a turma do Porto Alegre Country Club. “De vez em quando, também gosto de saborear após o almoço ou jantar. Meu favorito é o Cohiba”, pontua o empresário. Há 13 anos ele foi seduzido pela experiência e aproveita suas viagens pelo mundo para renovar o estoque. Na Itália, para os iniciantes nas capas, indica o Toscanello.

 

 

 

Texto Josiane Weschenfelder Rotta

Fotos Divulgação

Conteúdo publicado na edição 41 da Revista Gente que Faz



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