Paixão pelo voo livre

Gaúchos quebram recordes pessoais em voos de distância com paraglider. No currículo, importantes resultados em competições e, na memória, paisagens de tirar o fôlego      

Liberdade. Não há outra palavra na língua portuguesa que defina melhor a sensação de quem voa de paraglider e consegue ficar planando por horas, a mais de dois mil metros de altura, contemplando o mundo visto de cima. Mas cuidado: esse sentimento é viciante! Que o digam os irmãos Geisse, de Bento Gonçalves. Há 14 anos experimentaram e nunca mais pararam.

Como o voo livre depende muito das condições climáticas, Daniel, 40 anos, e Ignacio, 36 anos, praticam em todos os finais de semana com tempo favorável, quando não têm compromissos profissionais ou familiares. Agenda concorrida, diga-se de passagem, considerando que os dois, junto com o irmão Rodrigo,  estão à frente da Cave Geisse, vinícola especialista em espumantes, fundada pelo pai deles, o chileno Mário Geisse – enólogo que na década de 1970 assumiu a expansão da Chandon para a América Latina.

Colorindo o céu no Vale do Taquari  

No Rio Grande do Sul, um dos destinos preferidos da dupla é o Vale do Taquari, com voos que proporcionam uma incrível vista dos rios em meio às montanhas. São três rampas: em Teutônia, Roca Sales e Encantado. Como o paraglider está sujeito ao vento e à intensidade da atividade térmica para subir (correntes ascendentes de ar quente), na região a melhor época para voar vai de outubro a janeiro – embora a prática seja possível o ano inteiro.

Foi nesta última temporada que os Geisse conseguiram bater um novo recorde pessoal: 215 quilômetros em linha reta, em aproximadamente 6 horas de voo, em alguns momentos chegando a 70 km/hora e a mais de dois mil metros de altura.

“Decolamos em Teutônia e pousamos na divisa com Santa Catarina, em parceria com o amigo Michel Ceccato, dentista de Carlos Barbosa e um excelente piloto, com quem voamos desde o início, em 2004. Somos aficionados por voos de distância e esse foi incrível”, relata Ignacio.

Esse ano, também na região, conquistaram seus melhores resultados como competidores. Foi na modalidade Cross Country (distância livre) – Campeonato Charles Ferraz, que é organizado pela Federação Gaúcha de Voo Livre (FGVL). Esta categoria considera os três voos mais longos de cada piloto durante a temporada.

“Michel, Ignacio e eu estamos dividindo as três primeiras colocações. Esse é um fato inédito e que nos deixa bastante orgulhosos, pois é justamente a modalidade que mais gostamos. Este ano conseguimos realizar voos mais longos na maior parte do tempo juntos, desde a decolagem. Estávamos praticando há bastante tempo e é algo difícil de conseguir, mas que torna o voo muito mais divertido – como acontece com os pássaros, que voam em bando!”, compara Daniel.

Além da FGVL, os irmãos fazem parte da Associação de Voo Livre do Vale do Taquari (AVTVL), da Confederação Brasileira de Voo Livre (CBVL) e da Federation Aeronautique Internacionale (FAI). Ao longo dos últimos 14 anos já participaram de dezenas de competições. E este ano se preparam para o campeonato Europeu que acontecerá em Montclar, na França, em junho.

 

Para poder praticar durante todo o ano, os Geisse e seus parceiros de voo costumam partir em busca de outras regiões do país e do exterior. Montam um grupo, contratam os resgates e se deslocam para lugares como o interior de Goiás e Minas Gerais, entre outros.

No quesito “paisagens deslumbrantes”, mencionam dois voos memoráveis. Um foi em Baixo Guandú, no interior do Espirito Santo. A decolagem ocorre em uma formação rochosa enorme e o voo acontece em meio a pedras gigantes – que, segundo eles, fazem o Pão de Açúcar parecer pequeno. O outro foi no Deserto do Atacama, no Chile, com um sobrevoo sensacional.

Melhor marca na rampa de Teutônia

Assim como os irmãos Geisse, o técnico de informática Marcelo Wickert, 38 anos, de Lajeado, também comemora uma conquista da última temporada. É dono do recorde da rampa de Teutônia: no dia 11 de dezembro percorreu 247 quilômetros em linha reta, planando até Nonoai. Foram 6 horas e 4 minutos, numa velocidade média de 47 km/hora.

“Neste tempo todo, além de admirar o visual, precisamos ficar controlando os equipamentos, como o rádio de comunicação, GPS e o variômetro”, explica Marcelo. Este último apita quando o voo está em uma subida. Mas caso a tecnologia não funcione, o plano B é prestar atenção à natureza e se alinhar com os urubus, especialistas em ficar planando pelos ares.

Outra curiosidade é sobre a temperatura. A cada 100 metros de altura, a temperatura reduz em média um grau, por isso os praticantes precisam se agasalhar bastante. No dia em que Marcelo fez seis horas de voo, chegou a 2,6 mil metros de altura, assim suportando 26 graus a menos em relação à temperatura no nível do mar.

Com 14 anos de experiência em voos, o lajeadense coleciona resultados de destaque:  já foi campeão gaúcho, nos dois últimos anos participou do Campeonato Mundial, com etapas no Espírito Santo (2016) e em Minas Gerais (2017). Em 2015, ele ficou em 6º lugar no Campeonato Brasileiro, realizado nas cidades de Governador Valadares (MG) e Sapiranga (RS). Seu Record pessoal foi do Ceará ao Piauí, com 307 km.

Locais de voo: top 5 no Brasil
Confira a lista dos irmãos Geisse com os lugares onde mais gostaram de voar de paraglider no país.

1º Teutônia/RS
Rampa indicada para pilotos experientes, com excelente condições para voos de distância e um visual incrível da Lagoa da Harmonia. Um voo técnico que reúne no decorrer dos quilômetros percorridos diferentes condições de relevo (planícies, vales e montanhas).

2º Caçapava/RS
Rampa para pilotos de bom nível técnico, pois a decolagem é muito baixa, com térmicas e ventos fortes. Mas, sem dúvida, um dos melhores lugares do Brasil para buscar recordes de distância. Também tem um grande atrativo: sobrevoar a campanha gaúcha. Este é o nosso principal local de voo nos meses dezembro e janeiro.

3º Jaraguá/Goiás
Reconhecidamente um dos melhores locais para o voo livre no Brasil, procurado por praticamente todos os pilotos que desejam bater seus recordes pessoais. Isso graças a incríveis condições que reúne durante três meses do ano e que permitem, mesmo a pilotos sem muita experiência, chegar a superar os almejados 100 quilômetros de distância.

4º Pico do Ibituruna – Governador Valadares/Minas Gerais
Uma das rampas mais bonitas e com excelentes condições para a prática do voo livre no país. Neste local são realizadas muitas etapas dos campeonatos brasileiro e mundial.

5º Rampa Horizonte Perdido – Araxá/ Minas Gerais
Está entre as rampas com melhor estrutura e agrega condições fenomenais para o voo, com térmicas fortes e tetos de voo que superam os três mil metros de altura. Lá pode-se sobrevoar as minas de exploração de nióbio, que impressionam vistas de cima, além das enormes barragens que compõem as belezas do local, à medida que o voo vai avançando.

“O momento que estamos voando é de total desligamento com todas as questões do dia a dia, sem qualquer tipo de preocupação a não ser sobre a situação que estamos vivendo naquele exato momento do voo. Isso nos permite uma incrível conexão com os próprios sentidos, além de uma injeção de adrenalina que nos faz sentir vivos. E quando pousamos, temos a sensação de estarmos completamente revigorados, confiantes, agradecidos por tudo e prontos para voltar para a família, trabalho e encarar os desafios da vida com mais energia e alegria”, relato de Daniel Geisse

 

Por Josiane Weschenfelder Rotta

Publicado na edição 38 da revista Gente que Faz

 



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